sábado, 3 de novembro de 2007

A SACOLA REGINALDA


Nesse inverno-quente, abrindo os jornais, dei com notícias de que leis proibirão o consumo de sacos plásticos. São Paulo, Rio e outros estados. Em São Paulo o governo já vetou. Políticos de um lado e outro não se entendem. Uns dizem ser benéfica outros que é trocar seis por meia dúzia. A questão é a substituição das sacolas plásticas por outras sacolas plásticas biodegradáveis que se decompõe mais rapidamente na natureza. Parece que estes legisladores nunca foram ao teatro ou ao cinema ou recitais de poesias. Estão apresentando estes projetos por não conhecerem a sacola Reginalda. Se conhecessem, optariam pela sacola de pano. Uma lei tem que combater todos os casos de poluição. Não adianta nada trocar uma sacola plástica por outra sacola plástica porque se, em tese, acaba com a poluição nos rios e lagoas, não acaba com a poluição nos teatros, cinemas e recitais poéticos, nos nossos ouvidos. Poluição sonora. Quem já não foi perturbado por um barulho de sacola plástica durante a apresentação de uma peça, filme ou poesia? Proibindo a sacola plástica mataremos dois coelhos com uma sacolada só. Sacolada de pano. É atirar no que viu e acertar no que não viu: o barulhinho chato dessas sacolas plásticas nos espetáculos. Acho que daria para esse povo ser mais fino como os personagens do mensalão que usam malas e cuecas. Eles nunca foram pegos , fazendo barulho, com dólar numa sacola plástica. No Centro Cultural Banco do Brasil há uma jovem senhora que sempre leva uma sacola plástica. É o terror. E se reclamarmos ela só falta nos bater. Um dia assistindo à comédia “Fama para Todos”, ela sentou-se ao meu lado e as poltronas já estavam todas ocupadas. Tive de agüentar. Não agüentei. Pedi que parasse de mexer na sacola e senhora ficou uma fera porque chamei de sacola a sacola. Que gracinha! Era Reginalda o nome da sacola de supermercado dela. Gigi para os íntimos. Desbotada, parecia uma bolsa crepe. Toda enrugada. No teatro foi mais interessante ainda: um casal, ele careca, bola de bilhar, ela rolicinha, sentado ao meu lado com duas sacolas plásticas, uma delas se mexendo sozinha. Olhei duas vezes de cara feia, feio aqui é redundância, sou feio mesmo, e a mulher se desculpou dizendo que estava com desejo de comer galinha com batata. Não acreditei que uma galinha havia entrado no teatro, mas enfim: é Brasil... Daí a pouco a galinha querendo respirar, furou a sacola. Pior, desamarrou-se e fugiu. O pessoal naquela capacidade de improvisação incorporou a galinha, o careca e a rolicinha à peça e tudo terminou bem que era comédia, mas nem tudo é comédia nessa vida, às vezes há uma reflexão e a sacola plástica, as Reginaldas, atrapalham. A peça é feito a crônica, às vezes é uma sacola plástica, vazia, leve, às vezes é pesadinha com três quilos de batata dentro para cozinhar. Já pensaram a Bárbara Heliodora no teatro, coitada, atenta para fazer a sua crítica e uma galinha com três quilos de batata ao lado atrapalhando e ainda tendo que chama-la de Reginalda? Quando saí do teatro, dezenas de sacolas plásticas pelas ruas. Umas nas esquinas, conversando com os bueiros, outras correndo para lá e para cá nos cruzamentos...Uma até veio conversar com o bico do meu sapato, mas tranquei-a na lixeira. As ruas pareciam pertencer a elas. Um redemoinho passou e levou muitas sacolas para o céu. Em lá chegando, espero que aquele rio puro da água da vida prometido, claro como cristal, não esteja cheio de sacolas plásticas.

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